OPERAÇÃO MESOPOTÂMIA - Sobreviventes confirmam que Epaminondas foi torturado

Encontro em Porto Franco (MA) entre Abelardo Barbosa (de camisa branca) e Messias Gomes Chaves (de camisa verde), sobreviventes da Operação Mesopotâmia, com filhos de Alziro Gomes, Alberto e Simão, que estão prestando depoimento hoje à CNV em Tocantinópolis (TO). Foto: Marcelo Oliveira / ASCOM - CNV


Sobreviventes da Operação Mesopotâmia e familiares de vítimas já falecidas confirmaram em depoimentos prestados ontem à CNV em Porto Franco, Maranhão, que o líder camponês Epaminondas Gomes de Oliveira foi torturado com choques e espancamento em Porto Franco e Imperatriz antes de ser levado para Brasília, onde morreu sob custódia do Exército.

Ao todo, a CNV colheu 18 testemunhos ontem. Foram ouvidos dois sobreviventes da Operação Mesopotâmia, Messias Gomes Chaves, de 72 anos, e Abelardo Barbosa de Oliveira, de 81 anos. Eles contaram sobre as torturas sofridas e afirmaram que Epaminondas foi o que mais sofreu, com choques e espancamentos num acampamento localizado entre Porto Franco e Imperatriz. "Fomos obrigados a colocar as mãos por trás da cabeça e a assistir ao que fizeram com Epaminondas", contou Abelardo.

Os 18 testemunhos somam-se aos sete colhidos pela comissão na segunda-feira, inclusive de dois filhos, duas noras e dois netos de Epaminondas, totalizando 25 depoimentos gravados em áudio e vídeo pela comissão nestes dois primeiros dias de missão no Maranhão.

Um agente da repressão, o ex-militar do Exército Anísio Coutinho de Aguiar, que teve aulas de português com Epaminondas em Porto Franco, onde nasceu, foi ouvido e disse ter visto Epaminondas em Brasília já debilitado. O militar, entretanto, disse que Epaminondas não teria mencionado tortura na conversa com ele.

Treze parentes de cinco outros integrantes do grupo comunista liderado por Epaminondas Gomes de Oliveira e presos Operação Mesopotâmia também depuseram à CNV. Todas elas confirmaram que seus familiares: Pedro Araújo, Antônio Paulino, Abraão de Souza Brito, o Quebra-Queixo, Claudias Gomes Pereira, o Coló, e José Pereira da Silva, o Zé de Marcelina, também foram torturados e sofreram pelo resto da vida com os traumas causados pelas agressões.

Essas testemunhas também confirmaram que seus pais tinham dificuldade para contar as atrocidades sofridas enquanto estiveram presos e são unânimes em afirmar que Epaminondas foi o que mais sofreu. Além dos choques e espancamento, as testemunhas afirmaram que os militares, que agiam à paisana, obrigaram que os presos formassem duas filas paralelas de 15 homens e formassem um corredor polonês para dar tapas no rosto de Epaminondas.

À medida que prestavam seus depoimentos os presos na Operação Mesopotâmia eram liberados. Não houve instauração de inquérito ou acusação formal contra nenhum deles. Um pequeno grupo, que incluía Epaminondas Gomes de Oliveira e Zé da Marcelina, foi levado para Brasília, onde Epaminondas morreu, num Hospital do Exército, em 20 de agosto de 1971.

ASSASSINATO - O açougueiro Pedro Araújo, preso e torturado na operação, em 1971, foi assassinado 11 anos depois, em 1982. Sua família até hoje não sabe o que motivou o crime. Sabe apenas que os autores do homicídio eram homens uniformizados que teriam usado um carro fretado para ir até o município de Campestre. Ele foi chutado e agredido com o "coice" (cabo) de fuzis até a morte. Uma testemunha do crime, José Barbosa dos Santos, afirmou que os assassinos usavam fardas verdes e coturnos.

Segundo Messias Gomes Chaves, de 72 anos, um dos integrantes do movimento, o plano do grupo liderado por Epaminondas era lançar uma chapa comunista, mas filiada formalmente ao MDB, à prefeitura de Porto Franco, nas eleições municipais de 1972.

Chaves disse que o grupo ligado a Epaminondas foi ameaçado pelos militares, que diziam que eles não podiam contar para ninguém o que aconteceu. "Eu mesmo estou abrindo a história só agora, porque eu tinha medo", afirmou.

Até os anos 80, integrantes do grupo, que se desmobilizou devido à repressão, sofreram represálias. Em 1985, ele e a esposa, Dinalva Marinho Chaves, foram presos por uma noite devido seu envolvimento com o movimento sem-terra. Devido à prisão do marido, em 1971, Dinalva perdeu o segundo filho do casal e nunca mais conseguiu engravidar.

A CNV também ouviu Diclani Suissa Martins de Brito, filha de Geraldo Magela Brito, inventor e amigo de Epaminondas, que criou uma máquina chamada Moto Contínuo, um gerador de energia independente de combustível, que o grupo pretendia utilizar nas reuniões secretas dos comunistas em Porto Franco e imediações. Geraldo conseguiu escapar da Operação Mesopotâmia, pois foi avisado a tempo pela esposa. Com contatos no partido comunista, ele fugiu para o Rio de Janeiro, de lá para Cuba e, enfim, para a Costa Rica, onde se exilou, retornando ao país somente em 1979.

PALESTRA EM ESCOLA PÚBLICA - À noite, a CNV deu uma palestra sobre a atuação da Comissão da Verdade e o caso Epaminondas para alunos do Centro de Ensino Fortunato Moreira Neto.

No encontro com os estudantes, a CNV explicou o que são direitos humanos, o papel da Comissão Nacional da Verdade e o trabalho da comissão e da medicina legal no caso de Epaminondas Gomes de Oliveira.

Em seguida, a CNV exibiu trecho do depoimento de Joana Pereira da Rocha, nora de Epaminondas, aos estudantes, professores e funcionários da escola e doou para a escola uma cópia do documentário Marco, sobre o mais jovem desaparecido do país, Marco Antônio Dias Baptista, produzidos por alunos de uma escola pública de Goiânia.

Hoje, a CNV está em Tocantinópolis (Tocantins) para ouvir familiares de outras vítimas da operação, como Alziro Gomes, Antonio Aviador, e outros. Em seguida, a equipe da comissão retorna para Brasília.



Comissão Nacional da Verdade

Assessoria de Comunicação

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